O meu avô materno, além de excelente contador de histórias, foi uma das pessoas mais honestas que conheci.
Era incapaz de tocar em algo que não lhe pertencesse ou de enganar alguém.
Quando era feitor numa das muitas quintas que rodeavam as Caldas da Rainha, extremamente rica em árvores de fruta, era de tal forma zeloso, que não era capaz de apanhar uma peça de fruta caída no chão.
Habituei-me a escutar nas conversas de família, inúmeros exemplos desta postura, mas a que acho mais deliciosa, passou-se quando a minha mãe, ainda criança, percorria com a avó a zona das árvores de fruta e iam apanhando algumas peças caídas no chão. O avô assim que as viu, chamou-lhes gulosas e com um gesto de reprovação, perguntou-lhes se não sabiam que aquilo não lhes pertencia. Escusado será dizer que elas não lhe ligaram. Foi com esta postura que o avô nunca enriqueceu demasiado. Foi comprando algumas courelas, aqui e ali, com grandes sacrifícios e fruto do seu trabalho e da família numerosa.
Nesta altura não existiam empréstimos bancários e os contratos eram selados apenas com a palavra e com dinheiro vivo.
Gostava de o ter visto, garboso, a cavalo, percorrendo a quinta e os caminhos entre Caldas da Rainha e Salir de Matos...
Escolhi esta aguarela de Renato Guttuso, "Campieri", para homenagear o meu avô, Manuel Joaquim Saloio...
10 comentários:
Sente-se, em cada palavra, o carinho pelo teu avô.
Recordei muito da minha infância...os valores que me foram transmitidos, a sabedoria e a postura dos mais velhos.
Gosto muito de ler os teus textos.
Beijinhos
A amor e o orgulho pelo teu avô está aqui bem explícito.
Foram os nossos avós (pelo menos no meu caso) que nos foram transmitindo os valores que temos, com os seus exemplos de vida.
Já tinhas falado num outro post sobre esta característica do teu avô - a honestidade - mas não me recordo da estória que na altura contaste....
Beijinhos, Luís
Mesmo muito especial!
Um abraço solidário em memória do teu avô.
Acabei a leitura com um sorriso.
Não conheci nenhum avô, mas tenho memórias da avó Rosa, uma alentejana pequena, sempre a refilar, mas um carinho de pessoa, que tanto me ensinou.
Um abraço.
Se estamos sempre a aprender com os mais novos, o que dizer dos mais velhos, com tantos anos de experiência de vida, Ana...
Acho que os nossos avós, mostram-nos um mundo mais transparente e com mais profundidade, que os nossos pais, Maria.
Provavelmente por não estarem tão próximos...
Tudo é especial...
Um abraço para ti, Rosa...
A tua avó devia ser como a minha, Maria... mas claro que não deixava de ser um amor...
A minha mãe custa dizer, do alto dos seus 90 e tal anos, que hoje já não há homens sérios! Salvaguardando o exagero próprio da idade, esta gente vivia com a honradez na alma, "roubar" uma peça de fruta era como desrespeitar a família. Eram tão verdadeiros. Tão puros.
Bjs Luis
É verdade Franky, tinha os valores tão enraizados, que aos nossos dias, até parecem um exagero.
Mas como dizes também eram verdadeiros, puros e ingénuos.
Isso ainda se passa nas nossoas aldeias, ao ponto de alguns bandidos, em vez de se preocuparem em assaltar um banco ou as casas de milionários, entretêm-se a assaltar velhinhos, perdidos no nosso interior, a explorar a sua pureza e ingenuidade.
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