Quando somos pequenos as coisas são todas enormes...
Provavelmente, foi por isso que senti as ruas, as casas, mais estreitas e pequenas, quando regressei ao Bairro onde cresci e vivi até ao fim da infância.
Senti tudo tão diferente...
Os baldios das ruas detrás, onde jogávamos à bola, estavam agora ocupados por prédios, com os espaços vazios preenchidos por veiculos de quatro rodas, cada vez mais donos e senhores de todas as artérias urbanas. Estava tudo tão desumanizado. Não se viam pessoas nas ruas, tinham sido substituidas pelos carros que ocupavam os passeios.
Este vazio levou-me a reconstruir, passo a passo, as coisas e as pessoas que tinham desaparecido, desde o sapateiro, o Lugar onde se vendiam legumes e frutas, até às tabernas que já começavam a ficar a meio caminho entre a tasca e o café, com duas divisões, uma com a oferta do visionamento da televisão.
Lembrei-me dos amigos de infância, das suas casas... apeteceu-me espreitar as escadas interiores do prédio onde vivi, espaço de milhentas correrias e trambulhões, com as quais, eu e o meu irmão, punhamos a vizinhança em reboliço...
Procurei em vão, nos rostos com quem me cruzei na rua, gente conhecida. Não descobri traços familiares, foi como se tivesse chegado a outro bairro. Claro que isto acabava por ser compreensível, tinham-se passado mais de trinta anos...
Antes de tirar uma fotografia ao rés de chão onde vivi, e que ainda resistia ao tempo, perguntei aos meus botões: «estamos a transformar-nos em quê?»
22 comentários:
Cantava o Rui Veloso qualquer coisa como:
"Nunca voltes aos lugares
em que já foste feliz"...
E com muita razão. Porque também fui revisitar (exteriormente)a casa em que cresci, também a fotografei e está de outra cor, apresenta uma certa degradação, não é a mesma.
A original só existe, mesmo, cá dentro do coração.
E mais vale que as recordações se mantenham intactas, livres das "poluições" da "modernidade".
O mundo está em constante transformação, quer nos agrade, quer não (olha, versejei).
Por isso, Luís, mais vale seguir o conselho do Rui...
Aqui lhe ecnontrei entre imagens, poesias e então a reflexão sobre o que fomos, o que somos. Saudades, nostalgia e então no que nos transformamos???
Sim, isso também me pergunto quando regresso aos meus antigos dias, mas enfim as coisas vão mudando e um dia os pequenos de hj regressarão e verão que mais uma vez tudo mudou, para que??? Não sei, e isso me da medo descobrir!!!
O Rui tem de facto razão, Sininho...
Quando voltamos aos lugares onde fomos realmente felizes, sentimos sempre alguma desilusão, porque o tempo não pára...
Não são só as coisas que estão diferentes, também nos faltam as pessoas, com que partilhámos bons momentos.
Francieli, que nome bonito e original (muito italiano...).
Gostei de te ver por cá. Aparece mais vezes.
Eu ontem deixei aqui qualquer coisa escrito...mas por qualquer razão, não ficou publicado. Às vezes tenho problemas com o word verification, que tenho de repetir 3 e 4 vezes. Às tantas saí sem ter conferido se tinha ou não sido publicado.
De qualquer forma, só para dizer que conheço uma casa em Caldas, quase quase igual a esta, no Bairo da Ponte, a caminho do Cencal...
Para quem como eu nasceu e viveu até á maioridade em Lisboa, sempre tive a orfandade de ter uma "terra" para recordar! Daí ter sido tão agradável ler estas recordações de infância.
Bjs e obrigada por mais uma visita
TD
Tenho de subscrever cada palavra da Sininho, aconteceu-me o mesmo qdo fui visitar a quinta dos meus avós depois de a terem vendido - senti uma dor imensa no coração -, e estava degradada. De qualquer forma as minhas recordações costumam ter cheiro, sim, isso mesmo. É normal, não é?
bjos e bom fim de semana
Esta casa fica no Bairro dos Arneiros, Maria... numa rua que era a nº 26 (espero que já tenham dado nomes de gente às ruas... não lembra a ninguém morar numa rua que é um número).
Mas em Lisboa também existem bairros, mudanças... lugares para partir e voltar , Teresa...
Pois é Cris, mas nós somos teimosos, queremos voltar a ser felizes...
Te encontrei pelo registro de visitas deixado no rastreador do Lâmina, Escriba & SILÊNCIO e vim ver o que havia por detrás do nome do blog visitante...
E lendo o teu texto, lembrei-me do sítio - que no Brasil significa um terreno rural de grandes proporções - que meus pais tinham e para onde íamos sempre nos finais de semana, na minha infância. Ficava cerca de 40 a 50 de São Paulo e localizado no caminho para o Rio de Janeiro. Cortando as nossas terras, havia um lindo rio de águas cristalinas e fundo de seixos rolado e eu era proibida de me aproximar dele, mas sempre que podia quebrava a promessa e entrava de mansinho somente na margem, com seu fundo forrado de pedras, para sentir a água gelada deslizar pela minha pele. Havia também muitas árvores nas margens, o que fazia do lugar, um recanto mágico pela luz filtrada...
Mudei de cidade, de estado de vida e de tudo e passados muitos e muitos anos, voltei ao sítio para rever a casa dos finais de semana da minha infância. A casa estava lá, linda como sempre fora, embora jogada no tempo. As grandes árvores haviam encolhido... Estavam atarracadas; quase que retorcidas e a grande maioria delas, desaparecera.
E com certa apreensão, fui até onde deveria existir o rio caudaloso de águas transparentes e esse havia se transformado em uma vala tubular onde um líquido lodoso escorria lentamente...
Rodei por mais algum tempo pelo grande espaço já cercado por muitas construções desordenadas e com uma estética desconexa e derrepente percebi algumas orquídeas sobreviventes, em teimosas e insistentes árvores. Cuidadosamente eu retirei algumas delas e as trouxe para viverem comigo e hoje estão aqui, felizes e cheias de cores, em um outro sítio...
Não recuperei minha infância e nem os lugares por onde eu a vivi, mas recriei a memória, comparando as duas realidades.
Um bom final de semana!!!
Beijo,
Cris
Tens toda a razão, Cris, não recuperamos mas recriamos...
Volta mais vezes.
Refere François Chateaubriand que “não somos nada, sem felicidade”.
Qual é a sua opinião sobre este tema?
O François era um lirico...
Pensei exatamente na mesma canção que a Sininho... é impossível não pensar... Esqueceste (sempre esquecemos!) as regras da sensatez... só encontrarás erva rala por entre as lajes do chão......
E dá um aperto no coração que só quem já passou pela experiência é capaz de avaliar. Mas como é que o Carlos Tê foi capaz de avaliar tão bem e passar para palavras dessas, sem contar a melodia que me arrepia cada vez que a ouço... e ouço, muitas vezes, a ver se aprendo...
Bonito texto, rapaz, ainda que deixe alguns arranhões na memória afetiva, sobretudo pelo sentimento que te imaginamos.
Passei por acaso e revi-me neste post.
Pessoas diferentes, vivências diferentes, lugares diferentes MAS, sentimentos idênticos!!
Gostei muito, sinceramente!
É fria a rua da nossa infância.
Excelente texto!
Nunca aprendemos Ida, por muito avisos que o Rui (ou o Carlos) nos dê...
Gostamos sempre de voltar onde pessamos que cheira a felicidade.
Não me deixa "arranhões" porque sei que a vida é isto...
Concordo contigo, Alexandra, os lugares de "partidas e chegadas", são iguais em todo o lado, pelo menos interiormente..
Aparece mais vezes...
Eu diria que se torna fria, quando caminhamos por lá, sem encontrarmos o que ficou registado na memória, Maria.
Ja passei muitas vezes a este teu sitio ...
Beijoca e boa semana ***
A este nosso sitio... "Cor do Mar".
Boa semana também e um beijinho.
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