sábado, março 31, 2007

As Férias da Páscoa


Não me recordo de muitas histórias passadas em Salir de Matos, durante a pausa estudantil, que marca a passagem do segundo para o terceiro período escolar e que coincide com a comemoração da Páscoa e com os primeiros tempos da Primavera.

Claro que devíamos aproveitar o facto de nesta época os campos ficarem mais verdejantes e floridos, enquanto assistíamos ao regresso das andorinhas e de outras aves, que prometiam ficar até ao começo do Outono. Os ribeiros ainda tinham muita água e era sempre uma aventura saltar de um lado para o outro, mesmo que algumas vezes molhássemos os pés...

Em casa da avó havia as habituais restrições da carne, à sexta-feira, durante toda a Quaresma.
A única coisa realmente diferente, que recordo, era a decoração que se fazia no interior da casa, com alecrim e outras plantas, cheirosas e e bonitas, enquanto no chão e na entrada, se colocava rosmaninho, antecipando a visita do padre da paróquia, que transportava um Crucifixo grande e água benta, com a qual benzia a casa, num cerimonial extremamente silencioso.

Escolhi mais um óleo de José Malhoa, "A Caça", que ilustra muito bem os campos primaveris.

sábado, março 24, 2007

O Chafariz das Cinco Bicas



Lembro-me de descer a Mata da Rainha, ainda pequenote, de mão dada com o pai, misturado com a multidão que assistia aos jogos de futebol do Caldas (nos finais dos anos sessenta o futebol era quase a “missa” dos homens...) e de sentir quase sempre, uma secura, quando nos aproximávamos do Chafariz das Cinco Bicas.
O meu pai lá me fazia subir até uma das bicas, onde eu além de beber água, molhava-me, quase sempre mais que a conta...
Ás vezes entrávamos em algumas tascas, em vias de se transformarem em cafés, onde se jogava a “laranjinha” e outros jogo populares, que nunca percebi muito bem as regras. Imagino que o pai devia jogar com alguma mestria, pois tinha boa pontaria.
Lembro-me que uma destas tascas era a “Floresta” (tenho a sensação que falta mais uma palavra ou duas a este nome), que ficava na Rua das Montras e tinha um corredor comprido, que parecia um túnel...

quarta-feira, março 21, 2007

Sophia e o Dia Mundial da Poesia



Sophia de Mello Breyner Andresen é a minha poetisa de eleição.

É por isso que neste dia, em que começa a Primavera e se comemora o Dia Mundial da Poesia, ofereço-vos um poema, que escrevi, em homenagem a esta grande senhora.
Sophia,


O mar azul e branco
torna-se mais expansivo,
e tocante,
depois de sentir
a luminosidade,
o perfume
e o encanto
das tuas palavras...

segunda-feira, março 19, 2007

Obrigado Pai




Pai,
Obrigado Pai
por me teres mostrado
o sabor da liberdade
por teres deixado
abertas
de par em par
as janelas do mundo
e me deixares voar
para lá
da linha do horizonte
que nos separa do mar

Não tenho dúvidas
de que a tua rudeza e rebelião
fruto de uma infância
marcada pela exploração,
fome e abandono,
aliadas à tua anarquia e revolução
fizeram de mim
um muito melhor cidadão.

Obrigado Pai
por seres especial...

Por seres meu Pai!

Esta fotografia de Aníbal Sequeira simboliza a infância de meu pai, atrás dos rebanhos, por montes e vales.

domingo, março 18, 2007

Os Anos de Ouro do Futebol Caldense


Estou satisfeito por o Caldas Sport Clube seguir em primeiro lugar, isolado, na série D da III Divisão de futebol.

Embora mereçam o meu aplauso, não vou falar desta jovem equipa, que apesar de ter visto os ordenados reduzidos, no princípio do ano, pelas dificuldades evidentes com que se debatem a maior parte dos clubes de futebol, que têm vivido, anos a fio, acima das suas possibilidades, devido aos célebres sacos amarelos, azuis, verdes, etc, patrocinados pelas Autarquias, que só se mantêm, de uma forma visível, na Madeira do Alberto João.

Vou falar sim da equipa que pisou o principal palco do nosso futebol, nos anos cinquenta, a então I Divisão. Porque, finalmente encontrei a fotocópia da crónica de um grande "derby" regional, disputado entre o Caldas e o Torreense na tarde de 8 de Janeiro de 1956 e que acabou empatado a dois golos.

A ficha do jogo foi a seguinte:
Jogo no Campo da Mata.
Árbitro: Jaime Pires (Lisboa).
Equipas:
CALDAS - Rita; Piteira, Leandro e Fragateiro; Amaro e Romero; Romeu, Orlando, Bispo, António Pedro e Lenine.
TORREENSE -Gama; Inácio, Forneri e Fernandes; Belem e Gonçalves; Carlos Alberto, José da Costa, João Mendonça, Fernando Mendonça e Pina.

Há algumas pontos de vista curiosos nesta crónica do "Mundo Desportivo", escrita por Manuel Mota, que transcrevo, e começa de uma forma elogiosa para os caldenses: «As primeiras palavras têm de ser de elogio aos jogadores do Caldas. Quando o ambiente se tornou escaldante, eles foram, a bem dizer, os únicos que se conservaram calmos, procurando jogar, e não se deixando influenciar pelos incentivos contraproducentes que de todo o lado choviam sobre o terreno de jogo. Foi por isso que puderam construir um empate que parecia impossível, tranformando em 2-2 um 0-2. [...] O empate veio a ser, afinal, um resultado aceitável. Mas cabe aqui dizer que o mais aceitável ainda seria, sem sombra de dúvida, a vitória do "team" local. Só a primorosa exibição de Gama nas redes do Torreense impediu que o triunfo caldense se consumasse. [...] A natural e antiga rivalidade entre Caldas e Torres Vedras, aguçada este ano pela subida dos dois centros à 1ª Divisão, deu a este desafio um sabor muito especial. [...] Amaro e Romero acompanharam o ritmo de jogo do grupo e, na linha da frente, as derivações bem imaginadas de Bispo e os lances desconcertantes de um António Pedro, por demais agarrado à bola, forjaram várias situações delicadas para a defesa oposta.[...]

Que bela equipa, esta, que tão bem honrou os pergaminhos da nossa Cidade...
A fotografia que acompanha este texto é da época de 1953/54, quando o Caldas ainda jogava na II Divisão, retirada da separata dos Desportos do "Cavaleiro Andante", elaborada pelo saudoso Carlos Pinhão, amigo e jornalista dos bons.

sexta-feira, março 16, 2007

As Caldas e o 16 de Março de 1974


Hoje comemora-se mais um aniversário da tentativa de golpe de estado pelos militares do Regimento de Infantaria 5 de Caldas da Rainha.
Apesar dos esforços da censura em retirar a minha cidade do mapa da "revolução", acabou por não o conseguir na totalidade.

Claro que o 16 de Março foi tratado de uma forma ligeira, sem merecer grande destaque nos jornais, na rádio e televisão. Poucos souberam que aquela "brincadeira" fez com que fossem presos cerca de duas centenas de militares.

A Cidade acabou por ter conhecimento do caso, embora a maior parte dos seus habitantes não soubessem ao certo o que tinha acontecido. Não me lembro de ter sido tema de conversa em casa. Como eu e o meu irmão ainda éramos menores, os meus pais não costumavam falar destas coisas à nossa frente. Mas na Escola Preparatória Rafael Bordalo Pinheiro, onde estudava, esta rebelião foi bastante falada, e até ficcionada, pela imaginação fértil das crianças de onze e doze anos, que têm sempre um fascínio especial pelas histórias de “guerra”, entre os bons e os maus.
Um dos meus melhores amigos, filho de um militante do PCP, facto que desconhecia na época, contou-me, quase como se fosse um segredo de estado, que o pai tinha estado nesse dia com alguns amigos, no Avenal, a observar à distância as movimentações dentro e fora do Quartel. Munido de binóculos assistiu à saída e entrada de viaturas militares, assim como das forças da autoridade.
Felizmente, quarenta dias depois, a Revolução saiu mesmo à rua e não foi rebate falso.
Militares vindos de várias regiões do país invadiram a Capital e ocuparam os lugares estratégicos da cidade. As dúvidas iniciais dos “Capitães de Abril” transformaram-se em certezas, graças ao apoio popular de milhares de pessoas, que surgiram de todos os lados, de uma forma completamente expontânea, para dar vivas à Revolução e à Liberdade.

terça-feira, março 13, 2007

O Café do "Sovina"


Embora não fosse grande frequentador de cafés nas Caldas da Rainha, há um que têm algumas histórias para contar... e que descobri, na passada quinta-feira, que ainda esta aberto e, curiosamente, continua a pertencer ao senhor "Sovina". Esta nossa "alcunha" ficou para a história, porque o senhor era muito poupadinho (para não lhe chamar "forreta"...), até mesmo nos guardanapos de papel...

Nos anos oitenta este café era poiso certo de um grupo de amigas especiais, a Fátima, a Anabela, a Paula e a Anita. Passámos bons momentos naquele espaço sossegado e calmo (chegávamos a ser quase os únicos clientes) próximo da Praça da República, a caminho do Parque D. Carlos I.

Passaram-se mais de vinte anos, as nossas vidas deram voltas e voltas, ao ponto de quase termos perdido o rasto. Há filhos, maridos, esposas... e também outras cidades, Alcobaça, Lisboa, Almada, etc.

O mais curioso é que nunca tinha reparado que o café se chamava "Pastelaria Conde" e que era uma "peça" de museu, de 1895...

A única amiga ainda contactável é a Paula, que também reside na Margem Sul. Mas nem mesmo esta proximidade faz com que troquemos umas palavras, mesmo só por telefone ou telemóvel.

Gostamos de dizer que a vida é uma coisa muito complicada. Mas não seremos nós que a complicamos?

sábado, março 10, 2007

João Garcia Esteve "Mais Além" nas Caldas


João Garcia esteve nas Caldas, no dia 8 de Março, a apresentar o seu último livro “Mais Além”, em mais um Café Literário, no Café Pópulos, organizado pela Isabel Castanheira da Livraria 107, com a colaboração do meu irmão.
Fiz questão de estar presente por ter uma admiração especial por este grande campeão, que é, sem qualquer dúvida, a maior figura do desporto-aventura português. E devo desde já dizer, que foi um serão muito bem passado, graças à autenticidade e generosidade de João Garcia, que depois do visionamento de um pequeno filme e de uma breve apresentação, não se furtou a nenhuma das muitas perguntas feitas pelas pessoas presentes, mesmo as ingratas, que lhe avivaram as partes mais tristes das expedições, a perda de dois grandes amigos.
Fico com a sensação de que só agora é que o país se apercebe do valor de João Garcia, uma das grandes figuras do alpinismo mundial, que quer escalar até 2010 as catorze montanhas mais altas do mundo.
Já só faltam seis. Força João!

terça-feira, março 06, 2007

Tesouros do Mar



Falo quase sempre das minhas "memórias" campestres, esquecendo outros espaços únicos, como o Mar...

Quem nasce junto ao litoral desvaloriza muitas vezes a relação, quase umbilical, que tem com as águas movimentadas do Oceano e até com os mistérios que se escondem para lá da linha do horizonte.

Somos incapazes de vestir a pele de alguém que só viu a grandeza do mar, adulto. O que é perfeitamente natural...

Tudo isto, para dizer que a praia e o mar não são só contas de Verão, pelo menos na minha história...

Lembro-me de visitar a Foz do Arelho fora da época balnear e correr à beira mar, com o meu irmão, levando quase sempre com a maresia no rosto, que se aproximava da "chuva molha parvos".

Mas havia outros passatempos, como andar em busca de "tesouros" no meio do lixo transportado pelas marés.

Encontrava-se um pouco de tudo, pedaços de redes, boias de vidro, ripas de madeira, plásticos, garrafas, etc.

Estas últimas transportavam o mistério das mensagens enroladas, exploradas em tantos filmes, juvenis e não só (só encontrámos uma nestas buscas, escrita em inglês...). Mistério ao qual aderimos, mais que uma vez, enviando palavras que não recordo, para alguém que estivesse no outro lado do mar...

quinta-feira, março 01, 2007

O Fogão Natural da Avó



O fumo dos Vapores do Tejo, visitados no “Casario”, levou-me para outras paragens, mais exactamente para Salir de Matos, para a casa dos meus avós maternos...
Estes “fumos” lembraram-me que os avós sempre utilizaram a lenha como combustível, para fazer comida, cozer pão ou aquecer a casa (um aquecimento pouco central...). O pequeno fogão a gás era utilizado apenas para coisas menores, aquecer água para fazer café ou chá, ou ainda para estrelar um ovo. De resto, pouca utilidade tinha...
Além de aproveitarem os bocados de madeira das árvores e das cepas das vinhas, podadas no fim e no princípio de cada ano – num tempo em que tudo era “reciclado”, ou seja bem aproveitado, porque a fartura é coisa recente, mais dos nossos dias... – havia ainda outras fontes de armazenamento...
Durante as férias grandes do Verão visitávamos os pinhais das redondezas, onde enchíamos sacas de caruma, pinhas e bocados de troncos caídos, que eram óptimos para atear o fogo (eram as acendalhas daquele tempo...).
Eu adorava estes passeios pelos pinhais, na companhia dos tios e do meu irmão. Claro que muitas vezes, transformávamos aquela tarefa numa “batalha de pinhas”, escudados atrás dos pinheiros e com a cumplicidade dos tios, que só nos faziam parar, quando a “guerra” se tornava demasiado perigosa e as pinhas iam ganhando cada vez mais velocidade...
Como tudo mudou, quase num abrir e fechar de olhos.
À distância de mais de trinta anos, ainda sinto o perfume da lenha e olho as labaredas fortes, a chegarem ao cimo do fumeiro.
Quantas vezes me entretinha a atirar bocados de madeira, para manter o fogo bem aceso, e ouvia a avó dizer, em jeito de aviso: «os meninos que brincam com o lume fazem chichi na cama».