Ontem cruzei-me com uma senhora açoreana, que já deve andar próximo das oitenta primaveras e que já não via há meses.
Pela dificuldade em andar, mesmo com o auxilio da bengala, percebi o motivo...
Recordei-me da existência de uma espécie de antecâmara da morte, que nos vai toldando os movimentos e manietando, a pouco e pouco, o dia a dia. Obriga-nos a reduzir as saídas de casa, até deixarmos de sair, quase definitivamente. Começamos a querer ficar até meio da manhã na cama até ficarmos por lá, quase o tempo todo, mais que preparados para que a "coisa negra" passe e nos leve...
Costumávamos frequentar o mesmo café. Lembro-me dela desde sempre, tinha uns gostos um pouco exóticos, na maneira de vestir, de se maquilhar e até de tomar o pequeno almoço, embora fosse sabiamente compreendida pelos senhores, Manuel e Inácio, empregados de mesa.
Só trocávamos bom dia e boa tarde, embora uma vez me surpreendesse, dizendo que tinha gostado de ler um dos meus livros...
Tal como ela, todos os anos desaparecem rostos familiares das mesas do "Repuxo". Este ano o número deve aumentar, com a demasiado saudável, proibição de fumar, nos cafés e restaurantes...
O desenho é de Jorge Barradas...